segunda-feira, 4 de junho de 2012

JUSTA CAUSA: MEDICAMENTO ERRADO


II. 1. Inicialmente, cabe esclarecer que pode o empregador demitir o funcionário por justa causa, desde que esteja a situação elencada em uma das hipóteses do art. 482 da CLT, senão vejamos:

Art. 482. Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:
b) incontinência de conduta ou mau procedimento
c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando construir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
e) desídia no desempenho das respectivas funções;
f) embriaguez habitual ou em serviço;
g) violação de segredo da empresa;
h) ato e indisciplina ou de insubordinação;
i) abandono de emprego;
j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
k) ato lesivo de honra e boa fama ou ofensas físicas praticada contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem:
l) prática constante de jogos de azar.

II. 1.1. Assim, restará caracterizada a justa causa quando o empregado praticar ato, doloso ou culposo, de natureza grave que leve o empregador a conclusão de que ele não pode continuar prestando-lhe serviços.

II. 2. Nos termos do referido artigo, pode o empregador demitir um funcionário, por justo motivo, quando este, no desempenho de suas funções, o fizer de forma desidiosa. Mas o que  v em a ser desídia?

II. 2.1. Segundo a doutrina, desídia:

“A desídia funcional é outra falta aplicável ao empregado. Ela pressupõe culpa e caracteriza-se pelo desleixo, pela incúria, pela falta de zelo no exercício de suas funções. É desidioso o empregado irresponsável e não cuidadoso com o serviço que está realizando. (...) Quando o empregado comete um único erro, mas esse for de muita gravidade, pode haver a dispensa dele por desídia sem a advertência prévia, é o que está escrito no artigo 482, “e”, da CLT.”

II. 3. No caso em tela, o funcionário, por descuido, que aplica medicação de forma equivocada no paciente, o que, caso se concretizasse, poderia ter o levado a óbito, ou a grave sequela, resta caracterizada a desídia no exercício de suas funções.

II. 4. A jurisprudência entende que, em casos de administração de medicamento errado ou de uso de procedimento equivocado em pacientes, enseja a caracterização da alínea e) do art. 482 da CLT - desídia, conforme segue:

PROFISSIONAL DE SAÚDE. ERRO NA ROTULAÇÃO DE MEDICAMENTO. APLICAÇÃO INDEVIDA NO PACIENTE. JUSTA CAUSA. Auxiliar de enfermagem que rotula, indevidamente, medicação errada (de uso tópico - retal) como se fosse a certa para administrar ao paciente (intravenosa - diurético-osmótica). AS ADVERTÊNCIAS PRETÉRITAS POR FATOS DE SEMELHANTE NATUREZA, A GRAVIDADE DO ATO QUE PÕE EM RISCO A SAÚDE E A PRÓPRIA VIDA DO PACIENTE, BEM COMO A LARGA EXPERIÊNCIA DO PROFISSIONAL NA SUA FUNÇÃO, REPELEM A NOÇÃO DE QUE SE TRATA DE CASO ISOLADO E CONFIGURAM A JUSTA CAUSA PARA A DESPEDIDA. – grifamos.

1. JUSTA CAUSA. TÉCNICO DE ENFERMAGEM. DESÍDIA. A administração de medicamentos é uma das maiores responsabilidades da equipe de enfermagem na implção (sic) da terapêutica médica. Os erros daí advindos podem causar efeitos deletérios ao paciente, com sérias consequências, em alguns casos até a morte. Assim, a troca, por técnico de enfermagem, de medicação prescrita a paciente hospitalizada, configura desídia passível de rescisão de contrato de trabalho por justa causa.2. Recurso ordinário parcialmente conhecido e desprovido. (332200900710000 DF 00332-2009-007-10-00-0 , Relator: Desembargador Brasilino Santos Ramos, Data de Julgamento: 22/09/2009, 2ª Turma, Data de Publicação: 02/10/2009) – grifamos.

II. 4.1. Assim, conforme salienta a própria lição doutrinaria transcrita e a jurisprudência colecionada, ainda que em única vez, diante da gravidade da ocorrência, é possível a aplicação de demissão por justo motivo ao caso em tela.

II. 4.2. A jurisprudência, sobre o assunto tem se manifestado no mesmo sentido, senão vejamos:
JUSTA CAUSA - ATO DE INDISCIPLINA - ÚNICA FALTA DO EMPREGADO - POSSIBILIDADE - Ainda que ausente qualquer punição anterior ao empregado, no caso concreto, diante da gravidade do fato praticado pelo autor, ao descumprir norma interna da empresa, da qual tinha pleno conhecimento, incorreu em falta grave autorizadora da rescisão contratual sem ônus para o empregador. Ademais, diante da confissão ficta aplicada ao obreiro, tais fatos restaram incontroversos nos autos. Recurso a que se dá provimento para acolher a justa causa e julgar improcedentes os pedidos. (TRT15ª R. - Proc. 32143/00 - Ac. 28047/01 - 4ª T - Rel. Juiz Levi Ceregato - DOESP 10.07.2001) – grifamos.

II. 5. Entretanto, deve ser destacado que por ser a despedida com justo motivo um rol taxativo presente na CLT, deve se ter, para sua caracterização, grande corpo probatório, suficiente para comprovação da ocorrência do fato.

II. 5.1. A jurisprudência sobre o assunto fez notar o seguinte:

JUSTA CAUSA – Sendo a demissão por justa causa a mais severa das penalidades que pode ser aplicada ao empregado, o motivo ensejador deve ser suficientemente grave e ficar robustamente comprovado. (TRT 12ª R. – RO-V-A . 1317/01 – (02716/2002) – Florianópolis – 3ª T. – Rel. Juiz Marcus Pina Mugnaini – J. 12.03.2002) – grifamos.
JUSTA CAUSA – Sem prova segura, inconteste, não pode a empresa apenar o empregado com justa causa. Recurso improvido. (TRT 11ª R. – RO 0138/2001 – (787/2002) – Relª Juíza Solange Maria Santiago Morais – J. 19.02.2002) – grifamos.

II. 5.2. Diante da leitura dos julgados transcritos, é possível perceber que para que ocorra a demissão com justa causa faz-se necessário que reste bem provada sua ocorrência e sua gravidade, para que haja proporcionalidade entre a conduta do obreiro e a sanção a ele imposta.
II. 6. Diante das considerações acima expostas, entendemos ser possível a demissão por justa causa do funcionário que não realizou o procedimento correto para ministrar o medicamento e pôs em risco a vida do paciente, desde que observada a ressalva quanto a necessidade de elementos probatórios suficientes para a confirmação de ocorrência do fato. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário